Israel X Irã: ameaça de guerra direta e impacto em Gaza
Quais devem ser os próximos passos do governo Netanyahu em sua resposta aos ataques iranianos e na operação contra o Hamas
Por Fernanda Simas
O clima de tensão no Oriente Médio aumentou ainda mais após os ataques inéditos do Irã contra o território de Israel. Fato é que o conflito indireto entre os dois países entra em uma nova fase e a possível resposta israelense é apontada por analistas como determinante para vermos se o conflito vai se alastrar pela região - o que nenhuma parte parece querer - e quais serão os próximos passos israelenses em Gaza.
“Os dois lados se colocam como inimigos há décadas, mas do lado iraniano sempre houve a percepção de que era melhor agir indiretamente, por meio de seus aliados, como o Hezbollah (no Líbano), o Hamas (em Gaza) e os Houthis (no Iêmen). Israel tem agido da mesma forma, com serviços secretos matando cientistas ligados ao programa nuclear e utilizando programas junto aos EUA para atrapalhar o programa nuclear iraniano”, explica o professor de relações internacionais da ESPM Gunther Rudzit, especialista em Segurança Internacional.
Enquanto o gabinete de guerra de Israel - formado por integrantes do governo e da oposição - discute qual será a resposta ao ataque direto sofrido, o Irã afirma que ter seu território como alvo levaria a outra “resposta feroz e severa”. Nesta quarta-feira, 17, a comunidade internacional intensificou a pressão para impedir que haja uma represália violenta de Israel. Estados Unidos e União Europeia prometem, para isso, impor novas sanções ao Irã.
A ação iraniana do fim de semana passado foi uma resposta ao bombardeio israelense do dia 1.º de abril contra um consulado do Irã em Damasco, Síria, no qual sete integrantes da sua Guarda Revolucionária morreram.
O Irã lançou mais de 300 drones e mísseis balísticos contra Israel, mas quase todos foram abatidos pelo sistema de defesa israelense e com a ajuda de EUA, Reino Unido, além de países do Golfo, como Jordânia, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita. A postura iraniana, de acordo com os analistas, dava sinais de que a intenção era demonstrar poder na região, mas não abrir caminho para uma guerra direta.
O aiatolá Ali Khamenei anunciou o envio dos drones e mísseis com horas de antecedência, o alvo principal dos ataques foi a base aérea do deserto de Neguev, onde ficam os F-35 usados no bombardeio em Damasco e, horas após a ação, o embaixador iraniano na ONU afirmou que as operações estavam encerradas.
Para os analistas, uma guerra direta entre os dois países teria impactos significativos para todo o mundo. “Vai abalar a economia global, com barril do petróleo mais caro. Nem a Rússia sairia ganhando porque numa guerra entre Israel e Irã, as fábricas de drones seriam destruídas logo no começo e o Irã tem fornecido drones aos russos. Outros países do golfo podem acabar envolvidos, as consequências são várias”, afirma Rudzit.
Em Israel, o clima de tensão do fim de semana diminuiu e, agora, a população acompanha qual será a decisão do gabinete de guerra. “Uma guerra direta teria um preço muito alto para Israel, tanto em número de vidas, quanto em danos de estrutura e prejuízo para a economia. Essa escalada é uma consequência do que começou no dia 7 de outubro (de 2023), mas é difícil entender o cenário posterior”, explica João Miragaya, mestre em história pela Universidade de Tel-Aviv e morador de Israel.
Fator Gaza
Internamente, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, ganha fôlego porque vinha enfrentando protestos massivos nas ruas do país, que pediam um cessar-fogo em Gaza e mais ação do governo pela recuperação dos reféns que continuam nas mãos do Hamas desde os ataques terroristas de 7 de outubro.
Externamente, Netanyahu também ganhou um respiro na pressão que vinha sofrendo, principalmente de seu maior aliado, os EUA. “Quem sustenta Israel é o governo americano, que em breve vai votar, inclusive, um pacote de ajuda financeira, porque a economia israelense está sofrendo muito com a guerra. Esse apoio vai continuar? (Joe) Biden mostra que está ficando complicado, agora é preciso ver o que vai acontecer”, afirma Rudzit.
De toda forma, o governo Netanyahu continua falando que fará uma operação em Raffah para acabar com o que chama de último reduto do Hamas. No entanto, como lembra Miragaya, o número de soldados em Gaza diminuiu bastante nas últimas semanas.
“Agora, Israel está com uma brigada em Gaza, ou seja, uma força de 3,5 mil a 10 mil pessoas. Em determinados momentos, já teve sete brigadas atuando lá. Ao mesmo tempo, essa semana, o Exército convocou duas brigadas reservistas para treinamentos. Isso pode ser uma estratégia para forçar o Hamas a flexibilizar propostas de cessar-fogo”, explica o historiador.
Para os palestinos, a escalada do conflito entre Irã e Israel parece apresentar apenas derrotas. Israel recebeu no fim de semana o apoio estratégico de países árabes do Golfo e da Jordânia, países que tinham inclusive retirado embaixadores de Israel com a guerra em Gaza. “A situação pode ser uma derrota para a Autoridade Palestina e para o Hamas, também, que é o aliado do Irã. Tudo vai depender de como a população palestina vai ver a situação”, afirma Miragaya.
Para Rudzit, o cenário escancara a mudança de agenda de países árabes que vem ocorrendo desde a assinatura dos Acordos de Abraão - tratados mediados pelos EUA de Donald Trump entre países árabes e Israel visando a retomada de relações diplomáticas. “Antes, as monarquias diziam que reconheceriam o Estado de Israel se houvesse a criação de um Estado palestino. Os acordos inverteram isso, porque o Irã se tornou ameaçador demais para a Arábia Saudita, por exemplo”, diz.
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A crise diplomática do Equador
O Equador continua sofrendo impactos diplomáticos após a operação policial para capturar o ex-vice-presidente Jorge Glas. No dia 5 de abril, horas após o México conceder asilo político a Glas, uma força policial equatoriana invadiu a embaixada mexicana em Quito e capturou Glas - condenado a oito anos de prisão por corrupção.
Essa semana, o presidente Nicolás Maduro ordenou o fechamento das sedes diplomáticas da Venezuela no Equador e o retorno do corpo diplomático, “até que o direito internacional seja expressamente restaurado”.
Presidentes latino-americanos tentam chegar a um acordo sobre qual resposta dar à violação da embaixada mexicana em Quito, mas até agora não há um consenso.
Brasil e França pressionam por taxação dos mais ricos
Os ministros da Fazenda do Brasil, Fernando Haddad, e das Finanças da França, Bruno Le Maire, afirmaram, na sede do Fundo Monetário Internacional (FMI), que a comunidade internacional deve fazer mais esforços para que as empresas e pessoas mais ricas do mundo paguem “uma parcela justa de tributos”. O tema da evasão fiscal de bilionários ganhou força nos últimos meses.
A diretora do FMI, Kristalina Georgieva, falou do assunto, principalmente ressaltando o fato de que os países precisam aumentar suas receitas para manter as dívidas em níveis controláveis e conduzir a transição ecológica.
De acordo com dados da agência France-Press, a França está entre as economias do mundo desenvolvido que apoiam uma taxação mínima global de 15% e implementou uma tarifa mínima sobre as gigantes tecnológicas. O Brasil, que preside o G20 este ano, vem pressionando o grupo para adotar uma posição comum sobre o tema.
EUA retomam sanções ao setor energético da Venezuela
Os Estados Unidos vão retomar as sanções ao setor energético da Venezuela a partir desta semana como resposta ao impedimento, por parte do regime chavista, de opositores políticos disputarem as eleições de julho. Na prática, o governo americano não vai renovar uma licença que aliviava as sanções ao petróleo e ao gás venezuelanos.
“O Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros dos EUA (OFAC) substituirá esta licença por outra que permitirá a liquidação das transações pendentes antes de 31 de maio", afirmou uma funcionária americana, citada pela agência France-Press. Nos últimos seis meses, Caracas teve permissão parcial para vender gás e petróleo aos mercados internacionais.
A comissão eleitoral venezuelana inabilitou a líder opositora María Corina Machado e não permitiu que sua substituta, Corina Yoris, concorresse. Os EUA e outros países, como Colômbia e Brasil, criticaram a negativa dada a Yoris.