Eleição nos EUA: Kamala e Trump de olho nos Estados-pêndulo após debate
Democrata quer aproveitar momento de euforia após bom desempenho na terça-feira enquanto republicano intensifica críticas à questão migratória
Por Fernanda Simas
O debate realizado nesta semana entre Kamala Harris e Donald Trump ganhou destaque na imprensa mundial. Agora, os dois candidatos chegam ao momento final de suas campanhas e precisam transformar a euforia dos partidários em votos nos Estados cruciais para a vitória no Colégio Eleitoral.
Os EUA continuam fortemente divididos politicamente. Como em 2016 e 2020, é provável que a vitória venha a partir do voto de milhares de indecisos e independentes, mesmo que isso difira do número total de votos em todo o país, já que as eleições se realizam de acordo com o princípio do sufrágio universal indireto.
“A eleição precisa ser vista Estado a Estado”, afirma a professora de relações internacionais na ESPM-SP Denilde Holzhacker, especialista em EUA. Ela ressalta que o vencedor em cada Estado leva para a contagem final o número total de delegados daquele Estado.
“Os Estados onde a diferença (entre os candidatos) é de 1 ou 2 pontos, serão claramente decisivos. Kamala pode ganhar em volume por receber uma votação expressiva na Califórnia e em Nova York, por exemplo, mas se não ganhar em Estados-chave e o Trump ganhar por 0,5%, ele leva todos os delegados”, explica Denilde.
Os Estados-pêndulo, que por vezes votam nos democratas e por vezes nos republicanos, são 7: Wisconsin, Michigan, Nevada, Arizona, Pensilvânia, Carolina do Norte e Geórgia. Juntos, eles somam 93 delegados. Para ser eleito, o candidato precisa somar ao menos 270 delegados.
Para as próximas semanas de campanha, a candidata democrata espera aproveitar o impulso da elogiada atuação em seu primeiro debate presidencial, enquanto o republicano afirma que não vai repetir o duelo e redobra suas críticas ao governo Biden-Harris.
Corrida mais apertada
No início da campanha, Trump apresentava vantagem nas pesquisas de intenção de votos contra o então candidato democrata, o presidente Joe Biden. Desde que Kamala entrou na disputa, após Biden deixar a corrida eleitoral, essa vantagem vem diminuindo.
O site do jornal americano The New York Times mostrava, na sexta-feira 13, os resultados da nova pesquisa de intenção de votos realizada pela Ipsos. Kamala aparece liderando, no cenário nacional, com 49% das intenções de voto, contra 46% de Trump.
Nos Estados-pêndulo, Kamala aparece liderando em três: Wisconsin (50% X 47%), Michigan (48% X 47%) e Carolina do Norte (48% X 47%). Nos outros quatro Estados (Pensilvânia, Nevada, Geórgia e Arizona), os dois candidatos aparecem empatados, com 48% das intenções de voto.
“Ir bem no debate era essencial para (Kamala) ganhar um novo momento na campanha. O desafio é chegar nos grupos mais resistentes, ao eleitor de classe média branco, que já conhece Trump. Ou seja, a grande discussão da campanha dela hoje é como viabilizar o voto em Estados-chave”, afirma a professora Denilde.
Nesse sentido, a escolha do vice ganha importância dentro da chapa. “É preciso criar uma ligação com a classe média, pensando no americano do dia a dia, preocupado com inflação, com o pagamento da hipoteca da casa, em juntar dinheiro para a faculdade do filho”, afirma Denilde. “Esse eleitor não se sente representado por quem vem dos grandes centros urbanos. Os dois candidatos a vice (republicano e democrata) são pessoas que têm essa ligação, com histórias que os mostram como sendo parte do povo, com a mesma trajetória dessas pessoas.”
Recorrido pelos Estados-pêndulo
Nesta sexta-feira, Kamala realizou campanha na Pensilvânia, que pode ser o Estado mais crucial nesta eleição, com 19 delegados no Colégio Eleitoral.
De forma inusitada, no sábado passado, vários aviões fretados pelos democratas sobrevoaram estádios de futebol de universidades americanas carregando enormes faixas publicitárias. Uma continha a frase "Michigan: JD Vance <3 Ohio State + Projeto 2025" em frente aos torcedores da Universidade de Michigan.
A mensagem fazia referência ao candidato a vice-presidente de Trump e o cita como fã da Universidade de Ohio e apoiador do "Projeto 2025", um programa ultraconservador proposto por pessoas próximas ao candidato republicano - muito citado por Kamala ao longo do debate desta semana.
Trump, também nesta sexta, realizou campanha em Nevada, onde o tema imigração tem ganhado espaço. O republicano redobrou seus ataques contra os imigrantes e acusou sua rival democrata de querer transformar o país em um "campo de refugiados".
Continue acompanhando os passos de Kamala e Trump e os desdobramentos da corrida à Casa Branca com a Carta Global.
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A morte de Alberto Fujimori no Peru
Morreu na quarta-feira 11 o ex-presidente do Peru Alberto Fujimori, aos 86 anos. Fujimori governou seu país de 1990 a 2000, chegou ao poder com um discurso hoje muito comum na política, o do candidato anti-sistema. Dois anos depois, se tornou um ditador ao dar um golpe de Estado.
O golpe com apoio militar levou ao fechamento do Legislativo e mudanças no Judiciário, fortaleceu seus próprios poderes e o dos militares. Em um de seus piores atos, e muito lembrado por jornalistas peruanos amigos, Fujimori, argumentando que estava combatendo a guerrilha Sendero Luminoso, realizou uma política de esterilização forçada contra milhares de indígenas.
Filipe Figueiredo, em sua coluna no jornal “Estadão”, afirmou que “o autoritarismo estava no cerne de sua ascensão, de suas relações políticas, de seu governo e de sua maneira de encarar como se deve governar”. E essa talvez tenha sido uma ótima definição da relação de Fujimori com o poder político.
O ex-presidente ficou preso por crimes contra a humanidade por 16 anos, antes de ser perdoado em dezembro do ano passado. Fujimori foi sentenciado por sequestro, desaparecimento forçado e homicídio, entre outras violações de direitos humanos perpetradas por agentes do Estado em seu combate aos grupos da esquerda radical.
A guerra contra o terrorismo, como foi denominada oficialmente, deixou mais de 69 mil mortos e 21 mil desaparecidos entre 1980 e 2000, a maioria civis, segundo uma comissão da verdade. O ex-presidente foi considerado responsável pelos casos de Barrios Altos e La Cantuta, nos quais 25 pessoas foram executadas a sangue frio por um esquadrão militar em 1991.
Ainda assim, o país se despediu com honras de Estado de Alberto Fujimori. Dezenas de seguidores esperaram a saída do caixão, que foi carregado ao som de canções de apoio. Seus restos mortais foram velados na sede do Ministério da Cultura e o governo decretou três dias de luto até este sábado, dia do funeral.
“Tenho a sensação de dor porque morre um ex-ditador condenado por graves violações aos direitos humanos e corrupção, que estava se aproveitando, de alguma forma, de um perdão indevido ou negociado politicamente", disse Gisela Ortiz à agência France-Press. O irmão dela, Enrique, morreu durante uma operação militar na Universidade La Cantuta, em Lima. Ele tinha 20 anos e era estudante de Educação Física
Crise na Venezuela: sanções, exílio de opositor e mais pressão
A crise política na Venezuela aumentou muito nas últimas duas semanas. O candidato opositor Edmundo González Urrutia deixou o país após ter sua prisão decretada e recebeu asilo na Espanha e os Estados Unidos sancionaram funcionários venezuelanos por fraude eleitoral. Ao mesmo tempo, cresce a pressão internacional sobre o regime de Nicolás Maduro.
González chegou ao país europeu no domingo, depois de ter ficado um mês escondido na Venezuela. Em reação, nesta sexta-feira, Caracas convocou sua embaixadora em Madri para consultas, elevando o temor de uma crise diplomática.
E essa crise coincide com o anúncio dos EUA de sanções contra 16 funcionários do governo venezuelano, entre eles o presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Caryslia Rodríguez, autoridades eleitorais, integrantes da cúpula militar e dos serviços de inteligência do país sul-americano.
“Em vez de respeitar a vontade do povo, eles (chavismo) se atribuíram falsamente a vitória enquanto reprimiam e intimidavam a oposição democrática em uma tentativa ilegítima de se manter no poder pela força”, disse um comunicado da diplomacia americana.
Caracas reagiu ao anúncio e chamou as medidas de “novo crime de agressão”. As sanções incluem o congelamento dos ativos que os sancionados possuam direta ou indiretamente nos EUA, além da proibição de qualquer pessoa ou empresa americana de fazer negócios com eles.
A proclamação de vitória de Maduro desencadeou diversos protestos na Venezuela, que deixaram 27 mortos, cerca de 200 feridos e mais de 2.400 presos por “terrorismo”, segundo o chavismo.
Nesta semana, a pressão internacional para que os resultados da eleição possam ser verificados aumentou. Ao menos 50 países, entre eles EUA, integrantes da União Europeia e Uruguai, pediram na ONU que as autoridades venezuelanas publiquem os resultados eleitorais e permitam a verificação imparcial dos dados.
Até a sexta (13), as atas de votação da eleição de 28 de julho não foram publicadas. Autoridades eleitorais declararam Maduro vencedor, mas a oposição afirma que González foi o vencedor com mais de 60% dos votos.
Guayaquil vive novos dias de violência no Equador
A cidade de Guayaquil, no Equador, voltou a viver dias de violência com a morte de ao menos quatro autoridades penitenciárias. Em menos de 10 dias, a diretora da Penitenciária do Litoral - considerada a prisão mais perigosa do país - e o diretor do presídio de Sucumbíos, na fronteira com a Colômbia, foram mortos em ataques.
A Penitenciária do Litoral fica na saída de Guayaquil e foi palco dos piores massacres registrados no país, com o assassinato de 200 presos. Desde janeiro, todo o sistema penitenciário do Equador está sob intervenção das Forças Armadas.
Há duas semanas, outros dois agentes penitenciários foram assassinados quando se dirigiam ao trabalho.
Guayaquil é uma das cidades mais violentas do país em razão da presença de grupos narcotraficantes que disputam as rotas para o tráfico de drogas. Desde 2021, confrontos entre integrantes desses grupos narcotraficantes deixaram mais de 460 presos mortos.
O Equador marcou para 9 de fevereiro a realização de eleições, quando serão eleitos o presidente, 151 deputados e 5 representantes do Parlamento andino. O atual chefe de Estado, Daniel Noboa, que se diz de centro-esquerda e foi eleito em novembro do ano passado, buscará a reeleição.
Noboa chegou ao cargo no contexto de preocupação com a onda de violência vivida no país, após o direitista Guillermo Lasso recorrer a uma figura constitucional para antecipar as eleições e evitar o próprio impeachment pelo Congresso, de maioria opositora. Sua política tem sido de linha dura contra as organizações do narcotráfico que assolam o país.
Luisa González, que disputou contra Noboa e foi apoiada pelo ex-presidente Rafael Correa, afirmou que disputará novamente a presidência.